Os quatro mosqueteiros de Lavre que participaram na 1ª guerra mundial
- correio_da_historia

- 30 de set.
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Se Alexandre Dumas tivesse conhecido Lavre, talvez tivesse escrito sobre quatro mosqueteiros de calçado pesado e uniforme cá da terra. Não empunhavam espadas, mas rifles; não cruzavam palácios de Paris, mas enfrentavam trincheiras enlameadas na Europa e longas campanhas em África. Manuel Alves de Lavre, Bernardino Nunes, Anacleto António e Manuel Francisco tornaram-se, para a sua aldeia, os verdadeiros “mosqueteiros” da Primeira Guerra Mundial: unidos, corajosos e fiéis à pátria.
Partiram sem grande anúncio, apenas com abraços familiares e promessas silenciosas de regresso. Cada um carregava mais que a mochila de um soldado: levava consigo Lavre, a força das suas famílias e a esperança de quem ficava em casa. Manuel Alves de Lavre e Bernardino Nunes atravessaram mares e frentes de combate, enfrentando o frio das trincheiras e o calor escaldante das campanhas africanas. Anacleto António e Manuel Francisco suportaram o medo e a saudade, sem nunca perder a coragem que distingue os heróis silenciosos.
Não houve morte a assombrar os registos desses homens; todos regressaram, trazendo nas lembranças os ecos de tiros, marchas e camaradagem. Em Montemor-o-Novo, o Monumento aos Mortos da Grande Guerra ergue-se como testemunho da bravura dos seus filhos, lembrando aqueles que partiram e a comunidade que nunca os esqueceu. Embora nenhum dos quatro tenha perecido, a sua coragem e dedicação fazem deles figuras eternas na memória coletiva, quase como os mosqueteiros de Dumas, eternos na amizade e na fidelidade aos ideais que defendiam.
Passar por Montemor-o-Novo é cruzar com esta memória viva. Cada pedra do monumento, cada nome inscrito, cada gesto de homenagem mantém a ligação entre uma aldeia alentejana e os grandes acontecimentos do mundo, provando que a coragem não é medida pelo tamanho da guerra, mas pela determinação com que se defende aquilo que se ama.
Curiosamente, muitos dos homens de Lavre tiveram de se adaptar rapidamente a tecnologias militares que até então só conheciam por histórias: a artilharia pesada, os gases tóxicos, os ataques de artilharia noturnos e os primeiros carros blindados faziam parte da realidade de uma guerra moderna, distante da serenidade do Alentejo. Além disso, alguns destes combatentes participaram em batalhas simultaneamente no Frente Ocidental e em campanhas coloniais, vivendo experiências extremas em França e África, e regressando a Portugal com memórias de paisagens e horrores que poucos aldeões podiam imaginar.
Outra curiosidade é que, apesar de todos terem sobrevivido, vários sofreram com sequelas físicas e psicológicas, uma realidade pouco documentada na época. Os registos da Liga dos Combatentes indicam que muitos mantiveram correspondência constante com as famílias, relatando a dureza das marchas e a camaradagem que os ajudou a ultrapassar o medo. Essas cartas e relatos ajudaram a construir a narrativa de coragem que ainda hoje envolve os quatro mosqueteiros de Lavre.
Paulo Freitas do Amaral
Professor, Historiador e Autor





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