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A passagem secreta dos nazis no coração de Lisboa

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No coração de Lisboa, onde a grandiosidade da Estação do Rossio se ergue com a sua fachada manuelina e onde diariamente milhares de lisboetas passam apressados, esconde-se uma história quase esquecida, que liga a neutralidade portuguesa da II Guerra Mundial ao jogo perigoso das potências beligerantes. Poucos sabem que, atrás das paredes que sustentam a estação, existia uma passagem secreta que conduzia diretamente ao Hotel Avenida Palace, espaço discreto mas fundamental para a rede de espiões que então operava na cidade.

A capital portuguesa, neutral mas cobiçada, tornou-se um dos centros mais movimentados da espionagem europeia. Ingleses e alemães disputavam cada informação, cada contacto, cada segredo que pudesse inclinar a balança da guerra. Lisboa foi, nesse tempo, uma capital dupla: à superfície, soalheira e diplomática; no subsolo, sombria e clandestina. E foi nessa duplicidade que a passagem escondida do Rossio se tornou peça central.

Documentos históricos confirmam que o Hotel Avenida Palace, inaugurado em 1892 como Grande Hotel Internacional e renomeado em 1893, foi projetado pelo mesmo arquitecto da estação — José Luís Monteiro — e construído pela Real Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses para servir de apoio à Estação do Rossio. Registros apontam que, durante a II Guerra Mundial, existiu de facto um corredor no 4.º andar do hotel que ligava diretamente aos cais da estação, permitindo que figuras importantes e agentes secretos transitassem sem controlo policial.

O próprio hotel, símbolo de luxo e história, foi um dos centros preferenciais de alojamento de espiões alemães, segundo observadores ingleses da época. A elegância da Belle Époque, os salões requintados, a entrada discreta… tudo se conjugava para criar um espaço ideal ao jogo da espionagem na neutralidade lusa.

Lisboa, neutral mas não desprovida de segredos, viu no Hotel Avenida Palace não apenas um monumento da Belle Époque, mas um palco fervilhante de intriga. Entre salões elegantes e corredores discretos, diplomatas e agentes chegavam espreitadamente, embarcando na linha ténue que separava a neutralidade política de uma rede clandestina. O próprio feito arquitetónico — a proximidade com a Estação do Rossio e a construção dessa ligação interior — tornou-se metáfora do poder invisível dos enredos em curso, tecendo uma relação tensa entre o visível e o oculto.

Ainda hoje, o granito brilha sob os pés apressados dos turistas e lisboetas que atravessam a estação ou levantam os olhos para o elegante edifício do hotel. Só que, para quem conhece a história, essa façanha arquitetónica já não é apenas memória histórica: é um túnel erguido entre o banal e o extraordinário, entre o quotidiano da capital e o mundo subterrâneo da espionagem, lembrando-nos de que nem tudo o que parece sólido está à vista.


Paulo Freitas do Amaral

Professor, Historiador e Autor

 
 
 

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